ROBERTO CARLOS - Foto Internet
por ALEX MEDEIROS
Natal RN
Nos últimos dias, pessoas de várias
nacionalidades têm repetido na mídia e nas redes sociais que já não se faz reis
como antigamente, uma reação ao instinto predador do rei da Espanha, Juan
Carlos, abatendo elefantes nas savanas da velha mãe África.
Eu penso assim também. E estou aqui me
lembrando de quando menino ouvia canções sobre um jovem rei em ritmo de
aventuras e que pelas notas musicais e letras caçava um leão solto pelas ruas e
que, fera faminta, poderia querer comer o seu amor.
Aquele rei, noutra vez, se dizia um gato
de pele negra e desacatando outros bichos em cima do telhado. Maduro, anos
depois, cantou para salvar baleias e protestou contra o desmatamento da
Amazônia. Esse rei perpetuou uma gíria animal, “é isso aí, bicho!”
Na bela narrativa da sua trajetória, do
jornalista baiano Paulo César de Araújo – infelizmente mal recebida pelo
homenageado – há um trecho em que o rei manda seu motorista retornar
quilômetros numa rodovia dos EUA só para tentar salvar um sapinho.
Não. Não vejo no cantor e rei da MPB
Roberto Carlos uma grande referência ecológica e ambiental, mas entendo a
grandeza dos seus pequenos gestos em algumas causas, que se não diviniza
totalmente sua carreira, o faz sempre maior do que o resto dos súditos.
A construção do tecido social e cultural do Brasil nos últimos 50 anos tem, no seu alinhavo, a presença marcante dos fios musicais e comportamentais do artista e cidadão Roberto Carlos, por mais que tentem negar os intelectuais estacionados na Tropicália.
As canções do rei estão aí compondo
currículos emocionais de diversas gerações, todas invariavelmente com um ou
mais episódios pessoais envolvendo a figura de Roberto, presente como uma
sombra sobre as nossas cabeças e uma película colada aos corações.
Ditadores podem perpetuar-se por meio século no imaginário popular, devido à força da sua maldade. Mas, os reis, quando bondosos, seguem amados até o último dia no trono. Ninguém, como Roberto Carlos, sustenta um culto nacional sem ser bom. Muito bom.
Atire a primeira pedra em seu cetro,
quebrem seus discos, aqueles que – entre 30 e 90 anos – não tenham pelo menos
num dia na vida se deparado com o rei exercendo influência sobre seus
sentimentos amorosos, ou não. Roberto é uma tatuagem coletiva.
Sou de 1959, um dos anos berçários da Bossa Nova, período em que um jovem cantor de boates, oriundo de Cachoeiro do Itapemirim, no Espírito Santo, buscava um lugar no mundo imitando a voz de João Gilberto, o bom baiano que subverteu as notas do violão.
Minha geração, criada debaixo das ondas
do rádio, ouviu Roberto Carlos na placenta da Jovem Guarda, em escutas
paralelas e inadvertidas das músicas que os adolescentes dos anos 1960 curtiam.
Criança de 5, 6 anos, eu vi a onda do Calhambeque nas ruas.
Peguei carona no colecionismo do irmão mais velho com as figurinhas de chicletes estampando a moda da Jovem Guarda, as letras do iê, iê, iê que bebiam na fonte dos Beatles. Quando ouço “Splish, Splash”, pareço rebolado de volta à minha infância.
Dos muitos álbuns de figurinhas editados
a partir do apelo midiático da turma de Roberto Carlos, todos trazendo o mesmo
título “Ídolos da TV”, guardo ainda quatro deles, completos, e onde o rei é a
figura mais importante e repetida em suas páginas.
Os garotos que correram atrás daqueles
cromos tinham especial atenção na formação de duas grandes imagens, completadas
a partir de várias figurinhas e que formavam uma espécie de mosaico, com o rei
no seu calhambeque e com a camisa da seleção do Brasil.
De lá para cá, Roberto Carlos atravessou
cinco décadas reinando absoluto, senão como o melhor artista da MPB, mas
consagrado indiscutivelmente como o maior. É parte da historiografia das ruas e
ídolo também dos demais artistas que lhes prestam louvor.
Há um chavão sociológico que prega ser impossível desconhecer Karl Marx; pode-se ser contra ou favor dele, mas nunca sem ele. Cabe como uma luva em Roberto Carlos e seu vasto repertório que atende todas as tribos. E a ninguém é permitido ignorar a longa onipresença do Rei.
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